Como o prometido é devido, escrevo este post sobre um assunto que, para muitos, é a razão da nossa existência e está na base daquilo que faz movimentar o mundo: o amor!
Para além desse interesse geral, este assunto teve contornos complicados para uma pessoa do meu círculo de amigos, durante a semana passada. É para ela, também, que aqui deixo estas palavras, esperando que lhe possam servir de algum conforto.
Decididamente eu não sou a pessoa mais indicada para falar e escrever sobre este tema. Assim, prefiro deixar aqui alguns excertos de escritos de quem sobre ele escreveu. Trata-se de pequenos textos que abordam aspectos relacionados com o amor, e que nos permitem reflectir para além da ideia, ainda muito recorrente, do romantismo que lhe está associado.
Quando se pensa no tema “amor” vêm-nos à memória determinadas citações de poetas e escritores. Camões dizia que “Amor é fogo que arde sem se ver". Camilo afirmava que "Amor é uma luz que não deixa escurecer a vida". Fernando Namora sustentava que “O amor é a invenção de tudo, uma originalidade inesgotável. Fundamentalmente, uma inocência”.
Parando um pouco para pensar com maior profundidade e algum distanciamento, chegaremos, mais ou menos facilmente, à conclusão que todas essas frases não passam de visões românticas e idealizadas que se tem relativamente à pessoa que pensamos amar. Olhando bem para o nosso próprio caso, observando os que nos rodeiam - os casos dos nossos familiares ou os dos nossos amigos -, rapidamente nos apercebemos que a realidade sobre o amor é bem diferente da ideia romântica e idealizada que fazemos dessa pessoa. Com efeito, é uma realidade muito complexa, com contornos muito diversificados e que se entrecruzam, e muitas vezes é uma realidade dura e cruel!
A minha visão sobre o amor está muito longe de ser o que aquelas citações querem mostrar. É uma visão que não tem nada de romântico, é mais fria e mais vazia, se calhar é também mais egoísta. É, na verdade, uma visão em que quase sempre o sentimento, de uma forma ou de outra, se transforma em sofrimento!
«Penso que o amor é muito difícil. Existem muitos obstáculos a que possa ser o absoluto que é. A palavra amor é uma palavra muito gasta, muito usada, e muitas vezes mal usada, e eu quando falo de amor faço-o no sentido absoluto... há uma série de outros sentimentos aos quais também se chama amor e que não o são. No amor é preciso que duas pessoas sejam uma e isso não é fácil de encontrar. E, uma vez encontrado, não é fácil de fazer permanecer» (José Luís Peixoto)
«Nas relações amorosas o único sentimento que não funciona é o da piedade. Quando é o caso de que se devesse manifestar, o que surge não é a piedade mas o asco ou a irritação. Eis porque em relação alguma se é tão cruel. Todos os sentimentos têm o seu contraponto. Excluída a piedade, a crueldade não o tem. Por experiência se pode saber quanto se sofre quando não se é amado. Mas isso de nada vale quando se não ama quem nos ama: é-se de pedra e implacável. Decerto, tudo se pode pedir e obter. Excepto que nos amem, porque nenhum sentir depende da nossa vontade. Mas só no amor se é intolerante e cruel. Porque mostrar amor a quem nos não ama rebaixa-nos a um nível de degradação. E a degradação só nos dá lástima e repulsa. A única possibilidade de se ser amado por quem nos não ama é parecer que se não ama. Então não se desce e assim o outro não sobe. E então, porque não sobe, ele tem menos apreço por si, ou seja, mais apreço pelo amante. O jogo do amor é um jogo de forças. Quanto mais se ama mais fraco se é. E em todas as situações a compaixão tem um limite. Abaixo de um certo grau a compaixão acaba e a repugnância começa. Assim, quanto mais se ama mais se baixa na escala para quem ao amor não corresponde.» (Vergílio Ferreira – “Conta-Corrente 3”)
«Quando vivemos constantemente no abstracto – seja o abstracto do pensamento, seja o da sensação pensada -, não tarda que, contra nosso mesmo sentimento ou vontade, se nos tornem fantasmas aquelas coisas da vida real que, em acordo com nós mesmos, mais deveríamos sentir.
(…)
Nunca amamos alguém. Amamos, tão-somente, a ideia que fazemos de alguém. É a um conceito nosso – em suma, é a nós mesmos – que amamos.
Isto é verdade em toda a escala do amor. No amor sexual buscamos um prazer nosso dado por intermédio de um corpo estranho. No amor diferente do sexual, buscamos um prazer nosso dado por intermédio de uma ideia nossa. O onanista é abjecto, mas, em exacta verdade, o onanista é a perfeita expressão lógica do amoroso. É o único que não disfarça nem se engana.
As relações entre uma alma e outra, através de coisas tão incertas e divergentes como as palavras comuns e os gestos que se empreendem, são matéria de estranha complexidade. No próprio acto em que nos conhecemos, nos desconhecemos. Dizem os dois «amo-te» ou pensam-no e sentem-no por troca, e cada um quer dizer uma ideia diferente, uma vida diferente, até, porventura, uma cor ou um aroma diferente, na soma abstracta de impressões que constitui a actividade da alma.
(…)
O amor romântico é como um traje, que, como não é eterno, dura tanto quanto dura; e, em breve, sob a veste do ideal que formámos, que se esfacela, surge o corpo real da pessoa humana, em que o vestimos. O amor romântico, portanto, é um caminho de desilusão. Só o não é quando a desilusão, aceite desde o princípio, decide variar de ideal constantemente, tecer constantemente, nas oficinas da alma, novos trajes, com que constantemente se renove o aspecto da criatura, por eles vestida.»
Fernando Pessoa (“O Livro do Desassossego”)
Apesar de não fazer o meu género musical, penso que esta música, cantada por estas mocinhas, acaba por dizer o essencial: viver sempre com a eterna espera e com a procura constante “for the one”!
SPICE GIRLS – “Viva forever”: I’ll be waiting everlasting, like the sun … live forever, for the moment, ever searching for the one.